Hoje faz um ano que visitei o MoMA e vi a exposição do Tim Burton - aquela que chegaram a anunciar que vinha pro Brasil, mas depois desapareceu do mapa. Procurando umas fotos, achei essa matéria que escrevi pra revista Movie. Resolvi republicar aqui.
Se bem me lembro (provavelmente me lembro mal), o André Forastieri decidiu me pedir uma colaboração poucos dias antes de eu embarcar pra Nova York, e acabamos achando que era uma boa ideia. Por conta dos prazos de fechamento, acabei escrevendo a matéria no aeroporto, num teclado minúsculo de um EEE PC. Por isso, acabei dando uns tapas nessa versão aqui, que deve ser diferente dos tapas que a Maria Beatriz deu na versão que saiu na Movie # 5.
Parecia shopping em véspera de Natal – dez pessoas por metro quadrado, empurra-empurra pra caminhar e um calor dos infernos. Só que não era shopping, e sim a exposição dos trabalhos de Tim Burton no Museu de Arte Moderna de Nova York, o MoMA. Tem gente por todo lado. Mal dava pra ver as obras – que vão desde desenhos feitos para um concurso dos bombeiros de sua cidade-natal até uma escultura com movimentos robóticos do personagem Robot Boy.
A mostra, que inaugurou no fim de novembro e fica em cartaz até abril, é uma das mais populares do ano. Por lá, as filas constantes e o movimento forte marcaram as primeiras semanas da exposição (Nota: na época, eu não sabia que isso era fichinha. Semanas depois, amigos passaram mais de uma semana na cidade e não conseguiram comprar ingressos). No resto do mundo, a imprensa repercutiu os desenhos do criador de filmes como Peixe Grande, Edward Mãos de Tesoura e da nova versão de Alice no País das Maravilhas.
A filmografia de Burton por si só já justificaria toda essa atração que a exposição vem provocando. O diretor é um dos mais cultuados das últimas décadas. Suas criações saíram do mundo do cinema e passaram a ocupar uma posição de destaque na cultura pop. Por exemplo: Jack Skellington, de O Estranho Mundo de Jack, virou figura onipresente na cultura emo. Até hoje há bonecos de Edward Mãos de Tesoura nas lojas de brinquedos mais sofisticadas.
Mas a real é que a exposição cria um marco. Há um Tim Burton pré-MoMA: um diretor de cinema que faz filmes visualmente impressionantes e que havia lançado um livro de poemas. E há um Tim Burton pós-MoMA: um artista completo, que expressa sua visão de mundo gótica e lúdica em filmes, mas também em outros meios.
O Burton pós-MoMA é aquele que, num dos textos da exposição, se define não como um roterista, mas como um produtor de imagens – que podem se manifestar em qualquer meio.
Faz desenhos simples em guardanapos, mas também concepções visuais elaboradas com giz e aquarela. Faz esculturas que se mexem e encomenda outras para ajudar a pensar em filmes. Para consumo próprio, produziu uma série de fotografias em polaróide, que rendeu uma sala do museu dedicada apenas a elas, com a esposa, Helena Bohan-Carter e pedaços de bonecos de Jack Skellington. Escreve e ilustra poemas. Faz pinturas de seus personagens. Desenha muito. E também, claro, faz seus filmes.
Esse novo Burton, aliás, é um artista obsessivo – desenha muito, cria cada detalhe de seus filmes. E isso reflete na mostra: depois da seleção da curadoria, ficaram mais de 700 peças espalhadas pelo espaço. Entre elas, está a série Surviving Burbank, em que estão os desenhos feitos pelo Burton adolescente, leitor da revista Mad, morador de um subúrbio norte-americano. E os esboços para projetos nunca realizados, como o longa-metragem de Superman. E o clipe de Bones, da banda The Killers. E um estudo de animação em 3D para o personagem Stainless Boy. E máscara de Batman, capacete do Planeta dos Macacos, esboços de Alice...
Boa parte dessa produção visual também acaba de ser compilada em The Art of Tim Burton, um luxuoso livro de arte com quase 500 páginas (vendido apenas no site da editora). Não é um catálogo da exposição: vários trabalhos expostos no MoMA não constam do livro e vice-versa.
Na introdução, curta, Burton explica: toda a sua arte era pra ajudar a criar seus filmes ou apenas para ele mesmo. Nunca tinha pensado em torná-la pública – e só aceitou porque amigos e colaboradores davam sempre a mesma ideia: que tinha que mostrar.
Tinha mesmo: o Burton pós-MoMA não é um artista diferente. Mas é um artista melhor, mais completo, mais complexo e mais fascinante.