1. É mentira que voto nulo é igual a se abster de uma escolha. Voto nulo é dizer que você não concorda com nada disso que está aí. Também é uma escolha. Isso é óbvio. Mas não parece.
2. É mentira que o voto nulo é uma saída fácil. Até pode ser. Mas até aí escolher entre Dilma ou Aécio também pode ser uma saída fácil e impensada. Inclusive, pros meus parâmetros, a virulenta paixão pelos candidatos têm mostrado que é bem cômodo simplesmente odiar um lado e escolher o outro. E digo mais: o clima de torcida destas eleições tem transformado qualquer escolha em uma escolha burra. Só depende do ângulo que se vê.
3. De qualquer maneira, votar é uma obrigação, mas a escolha é de cada um. A pessoa tem direito em votar em quem quiser, como quiser e com o nível de reflexão que quiser. (O cenário bélico destas eleições cria em mim uma tendência de simpatizar com o voto dos bobos, dos inocentes, dos avoados, dos que se deixam levar pelo coração.)
4. Vi muitos amigos que falaram muitíssimo mal de um candidato no primeiro turno virarem a casaca e passarem a apoiá-lo. É um direito. Cada um é livre pra fazer o que quiser. Mas, nessa, não contem comigo. Amigos: eu lembro do que vocês disseram sobre os candidatos que vocês adotaram.
5. Cada voto é um aval. Quando o próximo presidente mandar bater em manifestante, matar índio ou desmatar a Amazônia, ele vai bradar que teve X milhões de votos. São esses votos que vão legitimar os transgênicos, a condução desastrada da economia, o desprezo pelos direitos humanos, o estímulo desenfreado a setores ultrapassados da economia. Cada voto a mais é um avalzinho a mais pro horror. Bem pequeno. Mas é. O voto nulo diz: "não ao horror".
6. Dadas as opções, não vejo alternativa ao horror. Não acredito em "menos horror" nem em "mais horror". Não acredito em dar aval a "menos horror". Horror é horror, merece apenas repúdio.
7. Não acredito em candidato perfeito, o que significaria anular pra sempre, como uma regra. Mas acredito em candidato razoável, em candidato OK, em candidato que dá pra engolir. No primeiro turno, eu vi uma pequena porção de candidatos razoáveis. Não teria anulado. Mas acredito em limite para o que posso tolerar. Quero ter o direito de dizer que os candidatos do segundo turno estão além do meu limite de tolerância, e quero que outras pessoas possam dizer o mesmo sem serem perseguidas ou chamadas de covardes, direta ou indiretamente.
8. Sei que, neste contexto de virulência e torcida, o discurso a favor do voto nulo é frágil. O voto nulo não tem equipe de marketing, não tem time de social media. Também não tem representante no debate, não dá entrevistana TV, não tem adesivo nem cavalete de rua. (Por isso mesmo, é um discurso mais forte: é um discurso sobrevivente.)
9. Fala-se muito do porquê escolher um candidato, e pouco sobre dizer "não". Temos que aprender a dizer mais "não". A não apoiar, a não dar aval. Por isso, defendo o voto nulo.