domingo, 2 de agosto de 2009
Por onde eu passo?
Todo mundo sabe o quanto é estressante dirigir ou andar de transporte coletivo em São Paulo. Mas as pessoas não se dão conta de que, em muitas regiões, andar a pé também é de enlouquecer.
Os motivos são vários: carros mal estacionados, obstáculos inesperados, fezes de animais domésticos e até calçadas bizarramente irregulares.
E o motivo é um só: a calçada foi dessacralizada. Deixou de ser o espaço do pedestre e virou uma terra de ninguém. Ninguém fiscaliza, ninguém cobra, ninguém reforma, ninguém reclama e todo mundo faz o que quer.
Digo mais: todo mundo faz o que quer. E não faz por mal. Simplesmente porque ninguém mais percebe o valor de uma boa calçada. Já estamos acostumados a caminhar sobre um terreno irregular. É automático.
É triste, mas é verdade.
Ontem, eu voltava pra casa. Vi essa cena:
Do lado direito, a obra de um prédio novo interditou a calçada com um guindaste. Do outro, a construtora pôs meninas com bandeiras pra chamar atenção para o empreendimento. Pra piorar: a calçada é estreita, mal tem um metro de largura em alguns trechos. Pra continuar piorando: a calçada é cheia de desníveis. Pra fechar o trem do horror: os postes ficam bem no meio da calçada estreita. E por onde eu passo?
Não acho que a construtora tenha bolado um plano para acabar com as calçadas da região. Seria burrice: se a zona é bacana, o prédio vale mais. Mas a empresa está tão acostumada a levantar bandeiras de um lado e guindastes de outro nem se dá conta de que está acabando com a calçada. Até porque os moradores da própria rua e o próprio governo não se deu conta de que pessoas teriam que passar por ali.
Outro exemplo é esse penhasco que faz as vezes de escada:
Na prática, até mesmo um jardim verde e bonito como esse vira um problema quando ocupa todo o espaço destinado à passagem:
Desde que comecei a prestar atenção nas calçadas, vi bizarrices tão incríveis que comecei a colecioná-las. Montei um álbum no Flickr pra guardar as fotos desses percalços urbanos. Chama-se Por onde eu passo?.
O motivo pra reclamar é simples. Se é ruim pra mim, imagine para um velhinho, para uma grávida, para uma mãe com carrinho de bebê, para um cadeirante ou qualquer pessoa com uma dificuldade qualquer.
Ok, a calçada da Paulista foi reformada e, dizem, tem acessibilidade plena, mas quanto tempo vai levar para que a cidade toda seja transitável para pedestres? E quando a reforma vai começar?
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5 comentários:
Na Paulista, depois que as calçadas foram reformadas, o fluxo de pessoas aumentou 15%. As pessoas querem andar a pé. Só não conseguem.
Infelizmente a cidade privilegia o veículo!
É um absurdo ter que se arriscar descendo da calçada e continuar o percurso no meio da rua.
Ótimo esse seu post!! :)
Olá, Nasi! Sou dramaturgo e diretor; essa semana descobri que você escreveu o DOGMA 2009 das HQs e fiquei bastante interessado em ler o texto - infelizmente não encontrei o link correto e achei seu blog.
Nesse final de semana também lancei o DOGMA 09, sobre o teatro.
Enfim, embora não tenha lido seu texto ainda na íntegra, sempre acho válido quando alguém se dispõe a sair da apatia e tocar em questões delicadas do nosso mercado de trabalho. Mas, infelizmente, nem todos compreendem a irona.
Passei para deixar um abraço e quem sabe trocarmos mais idéias!
Ah! Não te deixei o link do manifesto teatral... Taí na minha assinatura de comentário.
Abração
Estudo no Centro Universitário Claretiano de São Paulo, onde recentemente acrescentou-se o curso de LIBRAS - Linguagem Brasileira de Sinais - por determinação do MEC. Em 30 horas espera-se abordar um pouco do conteúdo sobre inclusão aos deficientes auditivos em qualquer nível.
Na aula, a discussão começou sobre o LIBRAS, mas invariavelmente desviou para a esta norma do MEC. Se inclusão é o objetivo, qual o propósito de ver apenas deficiência auditiva?
Mas seu post acabou citado ao longo da discussão e queria agradecê-lo. Inclusão não se limita aos deficientes físicos ou mentais, pode ser aos deficientes de carro próprios, e o pior, a causa desta deficiência varia muito, mas quem realmente gera os problemas a estes deficientes são pessoas endinheiradas, cultas, governantes que não normalizam regras para calçadas e ignorantes que fazem o que desejam.
Parabéns pela denúncia. Segue meu comentário em forum da faculdade:
Na com a professora Márcia o tema da aula acabou desviando de LIBRAS para o questionamento: se a aula tem o intúito de ser inclusiva e apresentar, nas 30 horas que o curso leva para ser concluído, por que abordar LIBRAS apenas, já que o tempo é curto para aprender da forma própria como deveria, não seria melhor abordar de uma vez todas as exclusões, para abrir os olhos?
Na aula eu citei a questão dos cegos, por exemplo, que muitas pessoas não sabem como conduzí-los, agarrando-os pelos braços ao invés de deixarem a pessoa apoiar-se sobre os seus próprios braços. Há também a questão das bengalas dos cegos, que possuem um código de cores que indicam ao mundo ao seu redor, qual é o grau da sua cegueira. No Brasil, desde que descobri isso, ainda não consegui ver nenhuma identificação nas bengalas além de fitinhas do bonfim. Por que não passar estas dicas de inclusão, que tornem mais natural nosso contato com os portadores de necessidades especiais?
Um último exemplo que deixo aqui na lista, até nós, que teoricamente não portamos nenhuma necessidade especial em teoria, por vezes vemos a ignorância e a pobreza de espírito causando problemas, ou os causamos, como nossas estreitas e deficientes calçadas.
O sinal para cegos na esquina de casa bipa a noite toda. Mas o pobre que saia do Centro cultural vergueiro só irá a uma esquina de distância do mesmo, em qualquer direção que caminhe. Não há nenhum outro semáforo sonoro daqui até a paulista!
E nós, que caminhamos, vemos e ouvimos, somos vítimas de outros como nós, por sua ignorância ou soberba, como na matéria do jornalista Eduardo Nasi, publicada em seu blog: http://eduardonasi.blogspot.com/2009/08/por-onde-eu-passo.html
E ai? Que fazer a respeito?
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