sábado, 31 de maio de 2008

Policiais torturam jornalistas. Você apoiou?

"O interrogatório e as torturas duraram sete horas e meia, período em que a equipe foi submetida a socos e pontapés, choques elétricos, sufocamento com saco plástico, roleta-russa, tortura psicológica e todo tipo de situação vexatória. Em um dos intervalos entre as sessões de agressões, a equipe identificou o barulho de sirenes iguais às das patrulhas policiais rondando o cativeiro. Mas os homens que chegavam ao local, em vez de socorrer as vítimas, eram solidários aos carrascos."

A milícia da Favela do Batan, em Realengo, no Rio, torturou uma repórter, um fotógrafo e o motorista da equipe, todos do jornal O Dia. A história está contada em detalhes na edição de hoje do jornal.

Milícia, no caso, é a reunião de policiais, bombeiros e funcionários da Segurança Pública, um grupo que, em tese, defende a favela dos traficantes. Seriam a lei onde a lei de fato não chega. E faria com quem rompe essa falsa lei o que a ler de verdade não permite: torturar e matar.

A lógica é torta. Uma frase de um dos torturadores, reproduzida na reportagem, é de lascar: "Existem muitos policiais corruptos, mas nós não somos corruptos. A gente se mata de trabalhar aqui, leva tiro de vagabundo para vocês chegarem e estragar o projeto social que estamos fazendo. Nós não somos bandidos".

São, sim. Claro que são.

Não por coincidência, tudo isso lembra os métodos do Capitão Nascimento, personagem do filme Tropa de Elite -- que virou herói nacional. Ano passado, a classe média aplaudiu de pé nos cinemas a tortura e a morte indiscriminada de "bandidos" pela banda podre da polícia. Na votação do site de cinema Omelete que elegeu "os melhores de 2007", por exemplo, o policial corrompido foi indicado (pela equipe do site) e eleito (pelos leitores) o herói do ano. O caso do Omelete não foi o único caso. Só o exemplo de que lembrei, justamente porque acompanho o trabalho do site -- que se deixou levar, quero crer, pela onda.

É esse tipo de pensamento inocente, que não avalia as conseqüências éticas dos aplausos, que fomenta a lógica torpe do mundo do crime. E leva, por tabela, a situações como essa, é endêmica.

O caso dos jornalistas d'O Dia tem que servir para alguma coisa. Alguém tem que dar um basta nessa palhaçada.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Sinal dos tempos

Vi hoje, aqui na frente de casa, um Chevette velho, todo estropiado, quase se despedaçando.

Mas ele tinha um GPS.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

O fascinante ornitorrinco

Sempre tem aquele conhecido que volta da Austrália se achando o máximo por conta de pele bronzeada e carcomida, à moda Crocodilo Dundee.

Entusiasmado, pergunto:

-- Você viu um ornitorrinco?

A resposta, pô, é sempre "não".

Acho muito esquisito que alguém voe meio mundo, se sujeite a um jet lag monumental, corra um baita risco de ter uma trombose venosa e depois sequer se dê ao trabalho de ir ver esses bichinhos tão fascinantes.



lost platypus, originally uploaded by popvulture.

Aliás, os ornitorrincos ficaram ainda mais bacanas hoje, com a divulgação da nova edição da revista de ciências Nature. A capa não esconde a novidade: o ornitorrinco é a atração principal da publicação.
O tema é que o genoma dos ornitorrincos acaba de ser completamente decifrado. E o resultado, como era de se esperar, é alucinante.

A doce criaturinha não só é um mamífero esquisito com bico de pato e cauda de castor que põe ovos, mas também é uma mistura de mamífero, ave e réptil no canto mais recôndido de seu DNA.

É um texto imperdível. Doce como as próprias criaturinhas.

terça-feira, 6 de maio de 2008

Coisas que estão acontecendo

* Geralmente eu odeio animações digitais, mas Bee Movie se supera. É chato pra caramba.

* Estou pensando em fazer uma viagem maluca. Vamos ver.

* Fico emocionado ao ver o cartaz do novo Indiana Jones quando vou ao cinema. A sensação não é de nostalgia, e sim de esperança.

* Mas na real eu quero mesmo é que lancem a caixa do Jovem Indiana Jones em DVD. Está entre as cinco melhores séries ever (com Família Addams, A Feiticeira, Minha Vida de Cão e Twin Peaks, oras). Mas necas. Nem de pré-venda.

domingo, 4 de maio de 2008

Tchau, Tuio

Ia escrever sobre o Falsa loura, esse puta filme, filmaço, do Carlão Reichenbach. Fui ver se tinha algo no Reduto do Comodoro que se pudesse aproveitar de alguma forma: uma foto bonita, uma citação qualquer.

Tinha. Tinha a notícia da morte do Tuio Becker.

O Tuio foi meu colega na Zero Hora. Era o crítico de cinema. Convivemos pouco na redação, mas foi o suficiente pra eu ver como o baita crítico que eu já lia no jornal trabalhava. E era uma coisa bonita de se ver.

Lembro especialmente de uma sexta. Eram 11h30min, e o caderno Cultura de sábado fechava ao meio-dia. Aí entrou, por agência, a notícia da morte de um diretor europeu importante, mas relativamente obscuro. O Tuio quis homenageá-lo. Com o aval e o apoio do Eduardo Veras, a contracapa do caderno, então pronta, foi derrubada para que o tal cineasta pudesse ser enterrado dignamente. Tuio sentou-se para escrever enquanto nós, os desocupados, nos mexemos para fazer os outros procedimentos necessários, tais como achar e baixar foto do cara, pré-diagramar a página e caçar nos livros referências sobre o morto.

Uns vinte minutos depois, Tuio tinha acabado o texto, coisa grande, de uns 80 centímetros (na medida do jornal, é um texto bem grandinho). Estavam citados no artigo os maiores filmes do cara, com o devido ano de produção entre parênteses. E estava tudo certo. Conferimos com os livros, pra ver se não tinha erro. Mas não tinha. No sábado de manhã, sem saber de nada disso, os eventuais leitores encontraram um artigo precioso. E quem leu nem sabia que por trás dele estava uma baita aventura.

Também lembro de um Festival de Cinema de Gramado que cobrimos, eu, ele e o Roger, talvez a mais enxuta equipe da redação a subir para a Serra nesta década. Agora me ocorre que talvez tenha sido o último ano em que Tuio foi a Gramado pelo jornal. Não lembro.

Saímos do jornal na mesma época, em 2001, ele se aposentando, eu indo fazer as revistas da RBS.

Continuamos nos falando, principalmente em cabines e em encontros por acaso no Centro, onde eu morava e ele ia ao cinema, por uns meses. Na época, dizia:

-- Agora que me aposentei, só vejo filme bom.

Tuio foi desaparecendo na medida em que o Alzheimer tomou conta. Eu também fui sumindo. De vez em quando, vinha uma notícia sobre ele, sobre a doença, sobre a internação.

Mais comum é eu lembrar do Tuio vendo um filme. Outro dia mesmo, vi Pequenos espiões, que ele tinha achado divertidíssimo. Na época, ele recomendou:

-- Mas espera pra ver em DVD, porque a distribuidora só trouxe cópias dubladas para Porto Alegre.

É isso: o Tuio vai continuar indo ao cinema comigo. E com muita gente. Principalmente se os filmes forem bons.

*


Quando vi que o Tuio morreu, fui correndo ler a coluna da Cláudia Laitano. Eles eram muito próximos. Mesmo sabendo que o Tuio rende incontáveis textos bons, eu tive a sensação de que o melhor texto viria dela.

E eu estava certo:

"Tuio distribuiu generosamente sua cultura e seu bom humor até o último dia de trabalho no jornal, há sete anos, quando se aposentou. Formou e informou todos os que tiveram o privilégio de conviver com ele ao longo de mais de 30 anos de jornalismo."

*


Fico pensando não no que o Tuio escreveria sobre Falsa loura, mas no que ele falaria. O universo que Carlão criou é uma dádiva para o humor sarcástico que Tuio tinha nos bastidores.

Homem de Ferro


Esse sujeito de armadura é o super-herói do momento, o Homem de Ferro. Seu filme está passando nos cinemas, e tem recebido elogios, ainda que moderados, da crítica.

A culpa é do moço logo abaixo, Robert Downey Jr. O ator passou uns anos no ostracismo depois de montar uma memorável coleção de merdas realizadas. É uma seleção tão primorosa que suas merdas estavam expostas em uma sala especial, como se fossem troféus, e todo mundo que pensava no cara logo lembrava das suas muitas merdas.

Homem de Ferro é sua redenção. No filme, nosso Downey Junior interpreta Tony Stark, um bilionário, mulherengo, ególatra, a dois passos do alcoolismo e, pra encerrar a lista dos adjetivos pejoraticos, dono da fábrica de armamentos que está fodendo com a população afegã porque supre também para as milícias terroristas. Mas Stark é seqüestrado e aprende que, a exemplo de Downey Júnior, estava fazendo uma coleção memorável de merda. E resolve se redimir usando a armadura para combater os bandidos que vendem armas (ou seja, sua própria firma) e as milícias terroristas afegãs.


Tenho uma hipótese que Downey Junior só funciona porque está apoiado em uma atriz que mata a pau, Gwyneth Paltrow -- por sinal, também sumida. Como Pepper Potts, assistente pessoal de Tony Stark, ela ressurge num papel delicioso. É ela quem faz a ponte entre o bilionário excêntrico e o resto do mundo.

A dupla, ou casal, sei lá, atua num roteiro com boas sacadas, que servem de contraponto à arrastada história da origem do super-herói de ferro -- ou melhor, uma liga de ouro e titânio.

Mas, e sempre tem um "mas", nem tudo é uma duplinha de velhos galãs em climinhazinho de romance.

Há uma cena que me incomoda desde o momento que eu vi, na tarde de sexta, mas que a parafernália do filme ofuscou até ontem.

Depois de se redimir e virar super-herói, Stark vai até o Afeganistão, mata uns terroristas, salva uns miseráveis de um bandidão e, no fim da cena, entrega o sujeito para os aldeões, dizendo:

-- Agora é com vocês!

Macacos em mordam se isso não é uma apologia ao linchamento, como se linchar e fazer justiça com as próprias mãos fosse uma coisa bacana.

Não é.

Há uma boa discussão sobre o tema na bela entrevista que a Flávia Tavares, do Estadão, fez com o sociólogo José de Souza Martins há alguns domingos.

Mas é o que o filme mostra: depois de se redimir e (quase) virar um modelo a ser seguido, ele passa a acreditar na justiça do olho por olho, no toma lá, dá cá, na vingança insana da coletividade e no fim da civilização.

Diferentemente de outras obras que retratam a violência, como Oldboy, Homem de Ferro não abre um fórum para a discussão do linchamento. Embora muitos assuntos sejam debatidos, não há nenhuma reflexão sobre o tema no subtexto do longa.

*


Voltando ao tema da classificação indicativa da MPAA, já discutido no post sobre o documentário This film is not yet rated, Homem de Ferro é, segundo a MPAA, PG-13. "For action violence and some sensuality", diz a avaliação.

*


Ontem, caminhando na Paulista, percebi que os camelôs de DVDs piratas anunciavam Homem de Ferro como o grande lançamento do feriadão.

sábado, 3 de maio de 2008

Grandes exposições: Star Wars e Revolução Genômica

Nave
Não curti a exposição de Star Wars que está no Porão das Artes. Traz maquetes, modelos, fantasias e -- o mais bacana -- desenhos de produção. Mas, em virtude do auê todo que fizeram na divulgação, a mostra decepciona.

Não fui só eu. Na saída, ouvi dois "Mas era só isso?" saindo de grupos diferentes.

Claro que os fãs mais fetichistas babam ao ver os droids R2-D2 e C-3PO de pertinho. Mas uma exposição, por mais mega que seja, tem que ser mais do que um exercício de fetiche.
(Mea culpa: armei um set no Flickr com meus fetiches e com flagras do fetiche alheio.)
Uau
É o caso da vizinha Revolução Genômica, também em cartaz no Ibirapuera. Lá, não dá pra tirar fotos. Nem precisa: você aprende coisas e leva novos conhecimentos na lembrança.

Muito, mas MUITO bem montada mesmo, a mostra começa falando de biodiversidade. Tem animais de verdade, vivos, como cobras e sagüis, para dar esse choque de que tem genética em todo o canto.

Captada a idéia, começa a parte mais científica, mais hardcore, mas muito bem explicada. Sempre didática, mas nunca bobinha, é uma baita duma exposição.

É menos badalada que Star Wars, mas muito melhor.
E sai pela metade do preço.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

"As Gas Costs Soar, Buyers Are Flocking to Small Cars"


Olhe bem pra manchete do New York Times de hoje: "As Gas Costs Soar, Buyers Are Flocking to Small Cars". Ela é histórica: nossos amigos norte-americanos estão deixando de lado os poluidores SUV e as picapes de lado, optando pelos compactos.

Em abril, um a cada cinco carros vendidos na América foram compactos ou subcompactos. "Quase uma década atrás, no pico dos veículos utilitários esportivos, só um em cada oito eram compactos", diz o texto de Bill Vlasic.

Os motivos apontados seriam econômicos: o aumento do preço do galão. Nãoparece ser uma onda de conscientização a respeito da mudança climática global, aspecto que a reportagem mal tangencia. Mas não é nada desprezível.

"É fácil a mais dramática alteração de segmentos do mercado que testemunhei em meus 31 anos aqui", disse ao Times George Pipas, analista-chefe de vendas da Ford.

Michael Jackson, executivo-chefe da AutoNation, maior varejista de automóveis de lá, é taxativo:

"A era das SUVs grandes com base de caminhão acabou."

Alguns impactos da mudança de hábito já pipocam aqui e ali. Os californianos já compraram 4% menos de gasolina em janeiro deste ano do que em um ano atrás.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

"America Online, Yahoo!, Excite, Netscape, GeoCities, AltaVista, @Home, and Prodigy"

"We established long-term relationships with many important strategic partners, including America Online, Yahoo!, Excite, Netscape, GeoCities, AltaVista, @Home, and Prodigy."

"We are planning to add music to our product offering, and over time we
believe that other products may be prudent investments."

"However, as we’ve long said, online bookselling, and online commerce in general, should prove to be a very large market, and it’s likely that a number of companies will see significant benefit."


Jeff Bezos, na carta aos acionistas da Amazon.com, em 1997.

Para mostrar a evolução da então apenas uma livraria virtual, o fundador da livraria anexou o velho documento à carta deste ano, que celebra, sem dar números, o sucesso do Kindle.

Não por acaso


Pedro (Rodrigo Santoro), Teresa (Branca Messina) e São Paulo

Muito, muito bonito Não por acaso, estréia em longa do diretor Philippe Barcinski. Bonito e rico. Daqueles filmes, raros, de que dá para escolher um aspecto e ficar falando sobre ele por horas e horas.

Rende papo sobre nosso tema mais candente, o trânsito -- será que um engenheiro de tráfego (Ênio, numa atuação contida e imbatível de Leonardo Medeiros) tiraria proveito pessoal do superpoder que tem numa cidade como São Paulo?

Mas também sobre a própria cidade, que aparece retratada em seus ângulos mais bonitos.

Dá para matutar sobre as imprecisões inevitáveis, sobre os minutos perdidos, sobre o que se ganha ou se perde com um atrasinho de nada -- porque Pedro, vivido por Rodrigo Santoro, parece um cara bacana, mas se revela megacontrolador. Acha que controla até as bolinhas do adversário na sinuca, mas na real não tem controle sobre nada.

Até mesmo a atuação pode virar pauta, porque elas são várias e boas, desde Letícia Sabatella como uma, err, chatinha, ou Branca Messina vivendo uma moça em transformação, ou a jovial e energética Rita Batata, que dá luz ao filme.