Vamos começar por aí: não gosto da tradução que deram para Inland Empire no Brasil. Toco no assunto não por apego ao título original. Não é manha. Mas é que simplesmente não se tratam de sonhos, e sim do inconsciente, essa terra de dentro de nós, esse continente pouco explorado.
Ou não é esse o tema do trajeto de Nikki Grace -- e, de quebra, de tudo que eu vi do David Lynch? Porque posso estar louco, mas vejo lá claramente uma viagem destemida ao Império do Inconsciente, um mundo onde o Cabo das Tormentas não tem muitas chances de virar Cabo da Boa Esperança.
Nikki Grace descobre, enquanto faz seu filme, que o tempo-espaço é uma ilusão: o futuro não traz nada de novo, e sim uma soma do que ela foi com o que ela é. O que vem por aí nada mais é do que nós mesmos, do jeito que fomos forjados.
Ela se assusta com a idéia. É difícil lidar com essa epifania negra, pouco libertadora, que vai contra os ideais ocidentais a respeito do que é ser um homem. Não sobra muito espaço para liberdade, e a igualdade e a fraternidade viram balelas de um tempo em que se sufocou o indivíduo em nome de algum bem maior, seja ele qual for.
Por isso que os recursos técnicos de Lynch são tão marcantes desta vez: a câmera digital não grava contrastes e, mesmo nesse mergulho de cabeça (na cabeça), sobram muitas áreas de sombra. Como no filme em si. Mas é melhor fruir e deixar fluir do que tentar explicar.
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